sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Sinédoque, Nova Iorque - o filme da semana passada

Comentários de Rubens Ewald Filho


Esperava-se muito da estréia na direção de Charlie Kaufman que ficou famoso como roteirista, tendo ganhado o Oscar por Brilho Eterno de uma Mente Sem Lembranças (02), tendo indicações também por Adaptação (02) e Sendo John Malkovich (1999). Mas depois de fracassar concorrendo ao Festival de Cannes de 2008, este estranho filme provocou reações desencontradas nos EUA, na base do ame-o ou odeio-o. O fato é que Kaufman exagerou na dose, fazendo um filme fechado, difícil de se suportar e analisar, a partir de um título para o qual não há explicações no seu desenrolar (ele sugeriu que as pessoas procurassem no dicionário, onde se diz que sinédoque é uma figura literária quando se pega a parte pelo todo, por exemplo dizer 50 velas em vez de 50 navios, o todo por uma parte (como falar em sociedade por alta sociedade), a espécie pelo genérico (cortador de gargantas por assassino), gênero pela espécie (criatura em vez de homem), ou nome do material de que é feita a coisa (a madeira de que é feita o palco em vez de palco). Mas o título do filme também é uma brincadeira com o lugar onde se passa a história, Schenectady, Nova York, um lugar que tem o Zip Code (de 12345).

Já de princípio tenho implicância com autor que não dá as chaves na obra para ela ser bem compreendida. Mas as pessoas, intelectuais digamos assim, gostam desse tipo de quebra cabeça e podemos pelo menos afirmar que Kaufman é mais consistente e sério que qualquer Lynch. Mesmo que por vezes incompreensível pode ser achar que Kaufman é pretensioso, mas sua inquietação ao menos parece sincera.

A história é centrada num diretor teatral chamado Caden Cotard (Hoffman), que tem paralelos com Proust, e teria uma doença chamada Síndrome de Cotard, que provarão ilusões negativas e nihilistas. Ele é casado com uma artistas plásticas (Keener) e pai de uma garotinha. Consegue uma grande verba para montar um super espetáculo de teatro de vanguarda e o tempo vai passando sem que os personagens percebam (porque os espectadores estão muito conscientes do sofrimento). Tem uma piada ótima quando um dos atores diz: mas faz 17 anos que ensaiamos e ninguém viu ainda!

A esta altura já ficou claro que se trata de um filme experimental, que brinca com a estrutura e o tempo cinematográfico. Ou seja, a expectativa já vira outra. Não espere muita coerência, aceite vôos de imaginação pela fantasia e a abordagem de forma inaudita dos grandes medos do ser humano: solidão, morte, doença, futilidade. Não é uma diversão recomendada a ninguém que queria um entretenimento leve e passageiro. Nem pensar. Assistir a segunda parte do filme é um exercício penoso.

Não cabe aqui uma análise mais aprofundada. Mas espero que tenham aqueles que a façam. Quem sabe quando eu vou rever o filme num bom cinema. Ele merece esse respeito ao menos.

(Fonte: http://www.rubensewaldfilho.com.br/home/cinema_detalhe2.asp?paNFilme=1644)

Nenhum comentário:

Postar um comentário